PSICOLOGIA - Resiliência: mentalidade a fortalecer
Pela Dra. Tânia Daniela Carvalho
Psicóloga Clínica
A resiliência é a capacidade de o indivíduo lidar com problemas, adaptar-se face a mudanças e adversidades e, sobretudo, conseguir superar obstáculos. Exemplos disso podem ser uma ameaça diária, um evento traumático ou, em situação mais complexa, uma tragédia. O indivíduo consegue encontrar algum tipo de solução para fazer face e superar uma adversidade com que se depara e ainda, reagir adequadamente ao stress e à pressão inerentes à situação.
UMA QUALIDADE ACESSÍVEL A CADA UM DE NÓS
Este tem sido um ano de grande adversidade, com desafios constantes, stress e ansiedade no pico e até eventos traumáticos, tais como a separação relativamente àqueles que amamos, perda de entes queridos, perda de emprego e dificuldades financeiras, enfim, perda da vida "normal" tal como a conhecíamos. Apesar de tudo isto, conseguimo-nos adaptar, enfrentando as circunstâncias e situações que antes disso pareciam impossíveis de superar.
A resiliência não é algo mágico e extraordinário que nos resolve todos os problemas. Não! A resiliência é uma qualidade que está acessível a cada um de nós, mas que necessita de ser desenvolvida e fortalecida. Uma vez construída, ajuda-nos a superar os desafios diários!
Por exemplo, a mentalidade que adotamos e a reflexão que fazemos sobre o que podemos aprender com uma dada situação complexa pode ajudar-nos a enfrentá-la de maneira mais eficaz.
COMO PODEMOS FORTALECER UMA MENTALIDADE RESILIENTE?
1. Mantenha-se conectado
É muito importante nutrir os relacionamentos significativos (com amigos e familiares) e fortalecer as suas conexões. Quando se encontra a passar por um período difícil na sua vida, é importante que não se afaste das pessoas e até, se se sentir confortável, pode aceitar a ajuda que lhe oferecem e o apoio que lhe dão. Sentir-se-á mais apoiado, mais “preenchido” emocionalmente, menos sozinho e, sobretudo, melhor consigo próprio.
2. Concentre-se no que pode nutrir e fortalecer e não no que precisa de mudar
Neste momento, muitas pessoas sentem-se cansadas, exaustas, sem energia, ansiosas e com um sentimento de incerteza constante. A ideia de focar na mudança parece, para muitos, mais uma ideia para a qual já não têm energia.
Em vez disso, parece mais sensato e útil neste momento adotarmos uma abordagem que pode ser focar-se no que pretende fortalecer. Por exemplo:
- Como fortalecer-se a si mesmo?
- Quais as relações e as pessoas que pretende nutrir?
- Quais as atividades significativas que possam ser mais importantes e benéficas implementar para si no momento atual?
- Procurar o contacto com um amigo que já não fala desde a infância;
- Descansar mais;
- Fazer uma atividade que sempre pensou em fazer, mas para a qual nunca teve tempo;
- Apreciar um pouco mais a natureza.
3. Mantenha-se flexível
Padrões rígidos e inflexíveis são barreiras à nossa adaptação aos desafios diários e, sobretudo, a novas realidades. Para uma mentalidade resiliente, é necessário largarmos esta rigidez para, aos poucos, passarmos a adotar uma mentalidade mais flexível e adaptativa. É importante afastarmos a ideia de que o momento presente será sempre condicionado por situações passadas e pelas nossas expectativas de como achamos que deveria ser. Nenhuma experiência é igual a outra, portanto, nenhuma decisão deverá ser igual a outra que tomou no passado. Permita-se alargar os seus horizontes.
4. Maior clareza de valores
Esta pandemia é o momento para considerar, reavaliar e esclarecer os seus valores. Ficar em casa por longos períodos de tempo é uma oportunidade para refletir se não será importante ir mais devagar e abrandar o ritmo frenético que tinha – não ter de ir apressadamente para o local de trabalho, não ter de correr para apanhar o transporte público ou até viajar menos – ou passar mais tempo com a família – começarem a comer juntos com mais frequência.
Outro aspeto que poderá considerar será passar a apreciar mais a natureza e as suas maravilhas. A natureza tem um poder reconfortante e revigorante, que lhe trará profundo bem-estar. Faça uma reflexão sobre o que esta pandemia o ajudou a reconhecer, quais as coisas mais importantes para si e sem as quais não consegue viver. Pense também sobre aquelas coisas que talvez não queira mudar, mesmo após a pandemia terminar.
5. Descobrindo os seus recursos internos
Se antes de iniciar esta pandemia, alguém lhe tivesse dito como seriam os próximos 12 meses ou mais, certamente teria pensado: “não vou conseguir lidar com isto”, "não sei como vou aguentar” ou “isto vai ser horrível e impossível de lidar”.
Neste momento, que já passou por grande parte dessa situação, se refletir bem, consegue perceber que já aprendeu algumas coisas sobre o que o ajudou a enfrentar tal experiência.
Contudo, é extremamente importante ter momentos de reflexão onde possa extrair aprendizagens das situações com que se vai deparando. Os seus recursos internos existem – e são mais do que muitos – para o ajudar. Conheça-os e coloque-os em prática sempre que necessitar. Aproveite-os, porque são seus, são valiosos e não necessita de despender dinheiro para os usar. Eles podem ajudá-lo a encontrar a calma quando se encontra dominado por um forte medo, a encontrar um caminho para manter o foco no presente e abstrair-se de pensamentos intrusivos ou a manter-se sereno e relaxado quando precisa de abrandar da azáfama do dia a dia.
Encorajo-o a descobrir toda a sua força interior, coragem e adaptabilidade às quais não sabe que tem acesso. Deixo-lhe algumas perguntas, para que faça uma breve reflexão:
- O que fez que o ajudou a enfrentar esses desafios decorrentes da pandemia?
- O que fez que o fizesse sentir bem?
- Que medidas tomou para promover o seu bem-estar?
- O que aprendeu sobre si mesmo, sobre a sua força e coragem?
- Que estratégias e competências usou para ultrapassar os momentos mais difíceis da sua vida?
Reflita também sobre o que ainda pode aprender.
6. Maior compaixão
Mesmo com tudo o que o mundo passou, as perdas de várias pessoas, a luta constante dos profissionais de saúde, o desejo de ajudar os outros e as demonstrações de solidariedade e compaixão têm sido enormes. As ações de apoio e homenagem aos profissionais de saúde, a ajuda a vizinhos e a pessoas carenciadas, a organização de apoio comunitário pelo mundo são alguns exemplos daquilo que de melhor temos feito. Este tempo de desafio e adversidade ativou o nosso cuidado inato, bondade, humanidade e compaixão.
Para ter em consideração:
- De que forma abriu o seu coração durante esta pandemia?
- Tocando na sua capacidade de cuidado, bondade e compaixão, o que isso despoletou em si?
- Teve algum gesto de cuidado e bondade com alguém?
- Permitiu-se ter um ato de generosidade e compaixão para com alguém próximo ou que precisasse de ajuda?
Não se esqueça que pequenos gestos criam grandes momentos.